VOLTANDO A FALAR DE TELEVISÃO

VOLTANDO A FALAR DE TELEVISÃO

João Eduardo Ornelas

Nos últimos dias estou com problemas com o sinal de tv aqui em casa, em Muriaé. Tanto que estamos em estudos, meus vizinhos e eu, para a possibilidade de instalar uma antena coletiva no prédio. Como a torre de transmissão fica do lado oposto à sala onde está a TV, o sinal chegafraco na antena interna. Tentando improvisar andei bolino com a antena interna mesmo, na qual emendei um fio mais cumprido e instalei-a do lado de fora, na coluna da varanda colando-a com fitas adesivas. Melhorou bastante e está quebrando o galho, mas quem vê aquele aparato todos fica admirado com tamanha gambiarra. Não se encontra igual nem mesmo nas barracas de ciganos. Paciência!

Mas o que quero dizer é que enquanto instalava o improviso, procurando a melhor posição para a antena, aquele processo de mexe um pouquinho, olha na tv, mexe mais um pouquinho, dá outra olhadinha, foi impossível não lembrar dos tempos antigos na cidade de São Francisco doGlória, onde mexer na antena procurando o melhor sinal que nem sempre era encontrado,  era uma rotina da maioria.

Para começo de conversa a torre ficava mais enguiçada que funcionando. Várias vezes assistimos da praça, esperançosos e ansiosos ao jipe do Elton Ricardo subindo o pasto em direção à torre para os reparos. Às vezes era noite e ficávamos olhando os faróis cortando a escuridão,igual tatu de madrugada abobado com a lua. Cheios de fé enviávamos mentalizações positivas ao Sr. Elton, torcendo para que ele fizesse algum milagre e nos restituísse o lazer mais importante da cidade naquela época. E ele coitado, na sua limitação humana fazia o que podia, que era pouco. Quandoconseguia uma boa regulagem a torcida passava a ser no sentido de que não houvesse um relâmpago ou uma queda brusca de energia que atrapalhasse tudo novamente. Vivíamos na expectativa e na certeza de que mais cedo ou mais cedo ainda ficaríamos na mão, e veríamos novamente o Jipe cinzasubindo teimosamente o pasto para mais um conserto.

Anos depois foi colocada uma torre lá no morro do Quenta Sol, na Serra da Providência, , um  local  muito alto e belíssimo. Fazendo um trocadilho com o nome da serra, essa seria segundo os entendidos a providência que solucionaria de uma vez por todas o problema do sinal de tv da cidade. Ledo engano, a dita torre serviu somente para inaugurar uma nova opção turística para os mais dispostos que se aventuravam a excursionar no local, e para aumentar a agonia dos moradores da cidade.

Explico porque: a princípio a nova torre nova transmitiria para a torre antiga que então distribuiria o sinal para a cidade. Acontece que o tal processo não funcionou, e as pessoas passaram a direcionar as antenas diretamente para a torre nova sendo que para melhor recepção, essas deveriam ser colocadas na posição vertical. Dava que a torre nova desregulava, e chovia impossibilitando o acesso, fato que levava o Senhor Elton a reativar provisoriamente a torre antiga. Então os moradores deveriam voltar as antenas para a horizontal e direcionar para a torre antiga. Otempo firmava, permitindo o conserto na torre nova, e lá ia todo mundo virar as antenas novamente. E essa ladainha tornou-se constante. Até que o Sr. Elton decidiu manter ambas as torres funcionando (ou quase)  independentemente uma da outra, deixando a opção para que o morador sintonizasse aquela que desejasse. Só que ninguém sossegava com uma das torres principalmente porque elas se alternavam oferecendo o melhor sinal. O vira-vira de antenas já estava instituído na rotina do franciscano, ainda mais quando a torre do Quenta sol mandava o sinal da Globo, e a torre antiga o daTupi. Muita gente instalou duas antenas, uma em cada posição. Lá em casa, meu irmão Alexandre muito engenhoso como sempre fabricou um mecanismo permitindo que com poucos movimentos se mudasse a posição da antena sem maiores trabalhos.

Uma cena comum na cidade era alguém trepado muna escada ou num telhado, girando uma antena e dialogando aos berros com alguém dentro de casa, tentando encontrar a melhor posição:

---Melhorou?

---Não.

---E Agora?

---Piorou.

---Ô bosta, e agora?

---Melhorou um pouquinho, só que ta passando o filme Planeta dos Mosquitos.

Apenas por Graça de Papai do Céu e talvez pela proteção de São Chico de Assis, o padroeiro da cidade, na ocorreu nenhuma tragédia parecida com a da imagem abaixo.

 

VIZINHO SORTUDO

Um caso à parte era nosso vizinho, o Antoinzinho, filho do Sr. Antonio Severiano. Sua antena era instalada na calçada amarrada ao poste num bambu cumprido que só de olhar dava tontura. Abrindo a janela da sala e esticando o braço ele conseguia girar o bambu com a antena everificar o sinal ao mesmo tempo. Esse conforto todo lhe permitiu depois de muita experiência adquirida no processo e paciência de pescador, o que aliás ele é, sintonizar, pasmem, o sinal da torre da cidade de Divino. Tal sinal era possível quando a torre antiga da cidade não estivesse emfuncionamento e somente naquele lugarzinho exato onde estava a antena do largo do Antoinzinho. Então quando todo o sistema entrava em pane, ele era o único na cidade que assistia televisão. E parece que só para provocar os vizinhos, o aparelho ficava ligado a noite toda. De vez em quando eleabria a janela, esticava o braço e dava mais um ajuste no bambu, quer dizer, na antena. Acho que na maioria das vezes era pretexto só para abrir a janela e encarar o resto da rua com ar triunfante. Alguns vizinhos tentaram sintonizar o mesmo sinal, inclusive nós, mas foi em vão. O bendito do sinal ia certinho na antena do dito cujo, e somente nela.

Perdi a conta das vezes em que fui dormir chateado por estar sem TV e ainda ter que aturar o vizinho com o aparelho ligado com o volume alto, o som um pouco rouco igual a galinha com gôgo, o que apesar de tudo poderia ser considerado  um luxo, devido as circunstancias. De vezem quando ouvia a janela ser aberta e o rangido do bambu sendo girado pelo vizinho vantajoso.

A mulher dele vivia dizendo:

--Vai dormir, Toizim. Parece menino. Amanhã você vai  trabalhar cedo.

Ele resmungava algo ininteligível e abria novamente a janela para outra regulada.

Mas parece praga, uma noite de tanto o Antoinzinho regular a antena, o fio foi enrolando no bambu e encurtando sem que ele percebesse. De repente, numa nova regulagem, quando o bambu foi girado, o fio puxou a televisão e...  CABRUUUMMM!!!  A televisão esborrachou no chão. A mulher veio correndo assutada:

--Eu num falei pro ce para com isso? Espia só.

Antoinzinho xingou um pouco, recolheu a televisão e não é que a danada continuou funcionando?

Naquela noite nos arrebentamos de tanto rir, mas na noite seguinte lá estava ele como se nada tivesse acontecido a girar o famoso bambu.

Quando enfim chegaram as antenas parabólicas e aquela agonia toda acabou, acho que o Antoinzinho até lamentou, pois no fundo aquele privilégio fruto do acaso fazia bem para o ego dele. Qualquer dia desses vou lhe puxar pela memória e tenho certeza que lembrará dessestempos com saudades.

Aí pode deixar que eu conto pro ceis, ta bão?

MAIS UMA PARA ENCERRAR O TEMA (será?)

NO TEMPO DAS PARABÓLICAS

As antenas parabólicas quando surgiram eram caríssimas e acessíveis a poucos. A prefeitura então construiu uma torre (mais uma) acima da caixa d’água que recebia sinal do satélite e retransmitia para a cidade. O equipamento permitia a retransmissão de três canais. A Globo e aManchete eram de lei, ficando a dúvida entre SBT e Bandeirantes. Para que o povo escolhesse, a principio ficou o SBT, e depois colocaram a Bandeirantes. Como a maioria protestou para que voltasse o SBT (fascínio pelo Silvio Santos), assim fizeram.

O retorno do SBT agradou a maioria, mas despertou a fúria de muitos aficionados do esporte transmitido pela Bandeirantes que naquela época mostrava até jogo de boleba. Desses o mais feroz foi o Wando Pedrosa, o popular Novo. Ele ficou p. da vida, xingava e esbravejava pelasesquinas. Como era época de campanha para prefeito, dirigiu-se ao Sr Ari Pedrosa, então candidato da situação e se fez porta voz dos defensores da Band, condicionando o apoio político à implantação da transmissão do canal na cidade.

Sr. Ari atendeu a reivindicação do Novo, pagou do borso, termo que ele usava para dizer que bancou com recursos próprios e instalou o sinal da Bandeirantes. O sinal do SBT continuou, pois não seria prudente desvestir um santo para vestir o outro em plena campanha.

Essa o povo de São Francisco ficou devendo ao Novo que a partir de então pode assistir tranqüilamente ao campeonato de sinuca e seu ídolo, o Rui Chapéu.

Valeu Novo. Muita paz para você.